Haveria um objectivo no meio daquilo tudo? Um sentir que se está preso numa rotina que não nos valoriza. O mundo poderia acabar e dentro do seu quarto nada mudaria, o mesmo ar quente, bafiento que caracteriza, não aquilo que pensa, mas aquilo que vive. É um pobre paralelismo aquele a que se vé associado, dia após dia, noite após noite. – está tudo bem – diz ele, diz para si, só mais uma vez; o mundo não continua e está cada vez mais perto. Uma dicotomia que não separa os seus membros, o instrumento de tortura medieval é uma brincadeira de crianças ao pé disto. Não separa, não arranca membros até lhe ser dada a libertação total. É uma morte lenta que não provoca necrose, não provoca granguena e não ser no espirito. È esmagado por dois mundos diferentes, cada um a querer juntar-se ao outro.
Encontra-se no meio, emparedado por duas superficies que tão bem conhece… os sinais que pode ler na parede, as fotografias emolduradas em encaixes dourados de promessas de vida calma. Molduras negras e podres de devassidão… – é isso que queres? Irás chegar à velhice sozinho, os teus amigos irão desaparecer – é isso que acontece enquanto as paredes se fecham sobre ele?
A primeira noite em que ele se apercebe disso é a mais dificil, fica deitado na cama e de repente o silêncio entra. Um grito ensurdecedor esmaga-lhe a coragem. Ouve choros, um homem gordo e infantil pede que o tirem de lá, as paredes fecham-se sobre ele. Uma voz goza com ele… acabou e começou. É rouca e ele continua deitado. A porta fecha-se, a luz apaga-se… a única claridade presente vem de uma janela onde nem sequer pode por a cabeça. Ele cheira a fragancia de uma noite de verão. A sua mente caminha os seus ultimos passos, ouve os pequenos sons de uma cidade a adormecer e chora. Quando a luz se apaga de vez acabou-se. As paredes fecham-se e esmagam-no entre elas. Ele tenta levantar os braços e logo no primeiro toque da pedra lisa e bege sente… não há força que pare o que está para vir.
Não há prazeres na vida.
Pega no telemovel e procura o nrº, olha alguns segundos para o visor e decide… vai ligar.
– Hey, onde andas? –
– Por ai… –
– Andas meio desaparecida –
– Yeah… –
– Queres fazer algo? –
– Aparece por ai, bebemos um copo –
– Podiamos passar um pouco de tempo juntos… –
– Eu vou andar por ai… –
– Ok, eu depois digo-te algo, xau –
– Até logo –
E de novo o mesmo, o quarto fecha-se com apenas a janela aberta, um leve ar frio que lhe chega à cara. Um mosquito que o chateia por breves momentos é morto com uma pequena palmada.
Deita-se, puxa o lençol e deixa o cobertor no fundo da cama. Amanha é outro dia… sem prazeres. Por momentos as paredes param e ele adormece… o som desaparece por uns segundos, a manha poderá trazer algo de novo pensa ele… mas nunca traz. Sonha em passar-lhe a mão pelo cabelo… só mais uma vez… e essas paredes ficarão quietas.
Carlos Cardoso
16/07/08
4 comentários:
a rotina repetitiva queima
a rotina repetitiva queim
a rotina repetitiva quei
a rotina repetitiva que
cool. angustiante.
As paredes só te esmagam enquanto aceitares estar enre elas...
"A primeira noite em que ele se apercebe disso é a mais difícil, fica deitado na cama e de repente o silêncio entra."
Quando este processo se inicia não para, 1º lei de Newton no vácuo, a apoptose existencial.
And it goes on and on...
Good stuff, keep'm comin'!
Já tinha saudades...
Diz-lhe para não desistir, para nunca desistir. Diz-lhe que não se deixe ficar sozinho.
angie
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