sexta-feira, 31 de março de 2006

Vulto...

Quis desaparecer para as sombras, tornar-me num espectro errante sem sentimentos. Tornar-me numa brisa fria que corta esquinas de ruas nuas. Nada mais. Não viver, não sentir, não amar, não odiar.

Queria que a minha pele se desfizesse e os meus ossos se enterrassem na terra. Lá aguardaria o fim de tudo. Do mundo, da humanidade. Da existência. Deixei-me cair no chão molhado. Nada importava. A vergonha era a ultima coisa que sentiria, a vergonha seria o meu túmulo.

Pensei em ficar ali sentado até o meu pó se fundir com o alcatrão. Esperaria a morte como quem espera pelo fim da tarde no verão. Ficaria calmo, não reclamaria. Nada me faria mudar, manteria os olhos abertos para poder chorar, para poder deixar a dor sair através de lágrimas.

Ali ficaria o meu espírito, tão leve naquele chão que nem o vento daria por ele. Caminhariam sobre mim se o deixasse. Não importava, ninguém me iria ver. São escolhas que se fazem, é o destino que escolhi para mim. Somos o que somos e não podemos fugir disso, nunca poderemos mudar. Mesmo que me levantasse e fugisse até ao Tibete o sol seria o sol, o vento seria o vento. As pessoas seriam as pessoas… e eu seria o mesmo. Ficaria ali, pequena sombra na esquina, caminhassem sobre mim e eu não o teria sentido. Esperaria o fim do mundo.

In "Desespero"

Carlos

2 comentários:

Anónimo disse...

Desde os meus tempos de estudante que não me deparava com uma prosa tão profunda e no entanto, tão acessível, tão coerente e tão rebelde, numa ânsia demolidora de mostrares quem és...

AnCaLaGoN disse...

Bem, eu sou um estudante desses cheios de rebeldia, logo tás no caminho certo! :D